terça-feira, 24 de junho de 2008

A Emoção e a Razão


Vivemos hoje um ritmo de vida altamente estressante em um planeta globalizado. O ritmo imposto pela competitividade é motivado, a cada segundo, por um marketing de valorização pessoal, que nos leva, cada dia mais e mais, a uma individualização absurda. Somos seres gregários, vivemos coletivamente, mas pensamos e agimos individualmente.
Os blocos formados na sociedade atual – seja no mundo, em nosso país, cidade ou em nossas atividades profissionais – buscam somente as vantagens pessoais e econômicas de forma selvagem altamente predatória aos oponentes. Estas atitudes colocam-nos em uma guerra individualista e destrutiva, onde seres humanos destroem seres humanos, não com armas bélicas, mas a omissão denominada de “politicamente correta”, que passa a ser a trincheira da defesa individual.
O “politicamente correto” faz-nos aceitar, pela omissão, a destruição das leis e das autoridades (instituições, Constituição...) em nome da tolerância e liberdade de expressão. Ser livre é, antes de tudo, ser responsável, respeitando a vida em sociedade. Dentro desta guerra fria de omissão, vemos um setor vital da economia nacional ser constantemente discriminado, humilhado e incriminado – embora seja ele a vocação e a viabilização econômica deste País. Refiro-me à Agronomia e à Agricultura.

Alimentos para a humanidade
Os produtores rurais ou são “latifundiários”, ou “destruidores do meio ambiente”, ou ainda “caloteiros” dos recursos públicos sem que em mais de quinhentos anos tenhamos sentado coletivamente, sem emoção individualista, mas com razão coletiva para traçar uma política agrícola. Esquecem que produzir alimentos é garantir a sobrevivência da vida humana no planeta com uma população de mais de 6,2 bilhões de seres, quando equilibradamente talvez 2 bilhões já seriam altamente lesivos ao meio.
A produção de alimentos para esta superpopulação (ainda em crescimento) é uma das causas da agressão ao meio ambiente, e como não podemos imaginar extermínio de homens, temos que racionalmente e coletivamente admitir que para amenizar os impactos precisamos lançar mão da tecnologia como única arma para o caos da destruição do planeta. “Quanto mais alimentos conseguirmos tirar de uma unidade de terra, menos terra iremos tirar da Natureza”. Esta é a essência da tecnologia agronômica, que tem a missão de produzir cada dia mais alimentos para bilhões de seres humanos.

Menor impacto ao meio ambiente
Chamamos, então, a atenção para a discriminação e desvalorização que a emoção individualista produz irracionalmente contra a classe Agronômica e Agrícola, criando a neurose coletiva dos “agrotóxicos” e do “desmatamento” em detrimento da valorização da Tecnologia, única alternativa que dispomos para amenizar o impacto de excesso de seres humanos.
Nas últimas décadas, o uso dos defensivos agrícolas pela atuação (pesquisa e assistência técnica agronômica) diminuiu violentamente em quantidade usada por unidade de área e tornaram-se sensivelmente menos agressivos aos seres humanos e ao meio ambiente. Os herbicidas caíram em dosagem, na década 60, de 2.097 gramas de ingrediente ativo por hectare, para 242 gramas de ingrediente ativo, na década de 90. Os inseticidas caíram, no mesmo período, de 1.900 gramas por hectare, para 69,75 gramas em 2.004. Fungicidas de 1.393,5 gramas, para 185,45 gramas de ingrediente ativo por hectare.
A toxicidade dos produtos dos anos 60 (dose letal – DL50) também decaiu significativamente, como no caso dos inseticidas de uma DL 50 de 64,8mg por kg vivo foi elevada para 10.416mg por kg vivo na década de 90, mostrando a preocupação agronômica em busca de produtos mais seguros (ANDEF – 2004).
Pelos números apresentados, fica claro o empenho e sucesso da agronomia e da agricultura, que na mesma área plantada praticamente mais que dobrou a produção de grãos. Mais alimentos, com menos defensivos e, portanto menos impacto ao meio ambiente e aos seres humanos.

A emoção em detrimento á razão
A tecnologia agronômica tem como sonho buscar o uso “zero” de defensivos, que acredito ser uma utopia, Mas esta parece ser a ambição de muitos profissionais da área, eu também sonho com o dia em que não mais usaremos medicamentos para termos plena saúde, mas me parece distante esta realidade.
Os princípios ativos dos agrotóxicos usados na agricultura são como os princípios ativos usados na medicina (remédios); o que define ser remédio ou veneno, tanto em um como em outro caso, é a dosagem recomendada e o uso correto para o fim devido. No idioma grego, não temos as palavras remédio ou veneno; o que define a atuação como remédio ou veneno é o uso e dosagem com que são usados os princípios ativos.
Pensando racionalmente, e não emocionalmente, podemos concluir que a ingestão de 10 comprimidos de AAS (ácido acetilsalicílico), remédio comum para incômodas dores de cabeça, poderemos provocar grandes problemas à saúde ao transformarmos o “remédio” em veneno, podendo levar-nos à morte.
O que leva a esta neurose coletiva dos “agrotóxicos”, eu repito, é antes de tudo a emoção em detrimento à razão. A solução para esta neurose de guerra de interesses em destruir a tecnologia agronômica é a omissão emotiva da sociedade (interesse econômico, promoção pessoal ou mesmo inocência) substituindo a razão. Pois sabemos, claramente, que a solução é a valorização e a participação do Engenheiro Agrônomo no uso adequado dos produtos – dosagem, uso e recomendação dos princípios ativos – pela sociedade.

Ausência de política agrícola
O consumidor tem que ter a clareza de que a garantia de alimento saudável é exigir a presença constante do “Engenheiro Agrônomo” no processo de produção dos alimentos em toda a cadeia produtiva. A maioria das hortaliças, frutas e flores não têm produtos registrados para uso nestas culturas.
Ausência de política agrícola deixa os agricultores desses alimentos à mercê de produtos não recomendados, ou mesmo sem qualquer alternativa, para a defesa sanitária de suas culturas. Porém, o uso de um defensivo agrícola para uma cultura, sem que o mesmo esteja devidamente registrado para o uso nesta, implica em ilegalidade (o que é correto) e a presença do mesmo em algum alimento produz a sentença de alimento “contaminado”. Fica claro, portanto que produtor de flores, frutas e hortaliças sem ferramentas para defesa de seus empreendimentos por omissão governamental, acabam usando os produtos ilegalmente premidos pela necessidade momentânea.
Resultados de análises de resíduos em alimentos efetuados pela ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) realizados entre 2001 – 2006 num total de 6.126 amostras apontam somente 4,7% delas com resíduos fitossanitários além do limite permitido por lei, enquanto as amostras com uso de produtos não registrados (caso citado acima) atingem 23,7%.
Resultados de resíduos em alimentos realizados pelo SIRAH – CEAGESP – MAPA – ANDEF – APAS e IB APTA entre 1.994 e 2.005, em um total de 3.082 amostras apontam somente 1,3% das mesmas com resíduos além do limite permitido e o uso de produtos não registrados uma porcentagem de 13,6%. Agora, em 2008, vemos circular notícias – tornadas públicas pela ANVISA – através da imprensa, de que apresentaram resultados insatisfatórios, em alguns produtos até 44% das amostras, que estariam contaminadas pelos agrotóxicos. Notícias essas sem citar maiores detalhes esclarecedores de que dosagem, ou se foram constatações de produtos não registrados, contrariando todos os dados aos quais temos conhecimento. Podem ser verdadeiras, mas me parece caso de promoção pessoal, inocência, ignorância, política ou mesmo econômica, motivadas mais pela emoção do que pela razão.
Enfim, faltam esclarecimentos. Enquanto isso, a neurose se instala na população e a Agronomia e Agricultura são, mais uma vez acusadas levianamente, embora trabalhem arduamente para garantir o alimento nas mesas da população – e ainda pagando a alta conta brasileira.

Eng. Agrônomo *Levi Montebelo é Vice-Presidente Sudoeste da Confederação
dos Engenheiros Agrônomos do Brasil - CONFAEAB